16 de setembro de 2009

Mas o que é Andara?

Vicente Franz Cecim


Esta pergunta sempre retorna retornando sempre outras respostas.


Andara, o que ela parece mais querer, é o Advento de uma Literatura Fantasma. Fantasma como são os seres de Neblina que a percorrem. Mas ainda mais sutil que eles. Andara, os livros escritos, os livros visíveis de Andara, ainda pudessem ser lidos por quem assim quiser, ou não puder mais que isso, como Literatura Fantástica. Mas o Livro Invisível de Andara, aquele que não-é escrito, aquele que já é não-livro, esse: Isso, já é Literatura Fantasma. Literatura de Ausência. Está para a Literatura como os números trans-finitos de Georg Cantor, talvez eu pudesse comparar, que se iniciam ali, seja Onde isso for, onde os números finitos se acabam. Literatura Fantasma é Literatura de Ausência de Literatura. De Ausência até mesmo da Presença Rarefeita da Escritura, por mais rarefeita que ela seja. Está num além em nós. Nietzsche perguntando pela voz de Zaratustra: - O homem é coisa ultrapassável, o que fizeste para ultrapassar o homem, o que fizeste para atingir o Além do Homem? Pois ele nunca falou em Super-Homem, isso foi manipulação do Nazismo: über mensh, ele disse, e isso é dizer: Além do Homem. Mas essa é uma visão ocidental, a visão ocidental de Nietzsche. Andara se desampara é no Tao. Andara quisesse fosse as Outras três partes do discurso que se mantém secretas, não são postas em movimento, mencionadas pelo Hino do Rig Veda, que diz que só conhecemos a quarta, que é a língua dos homens. Andara não busca nada assim, como neste trecho de Nietzsche, com um sentido único de Ida: Andara busca, no homem, tanto o umanoh quanto o umano, tanto o além quanto o aquém do homem. Evocando Flaubert e Madame Bovary, uma vez eu disse, também: - Andara sou eu. De uma certa forma, sim. Mas há uma definição melhor de Andara por Cervantes. Está lá, na abertura daquele seu belo, sobrenaturalmente Belo, Os trabalhos de Persiles e Sigismunda, obra que comovidamente ele terminou em seu leito de morte, morrendo - mas em vez de Morte ou prefira a palavra Metamorfose, e escrevendo a última página e se despedindo do Leitor e informando que estava terminando naquele ponto o livro porque o Livro da sua vida estava, naquele exato momento, também fechando as suas páginas visíveis. Aquela Voz é Andara. O livro de Cervantes começa com uma voz gritando do fundo da Terra, se lançando para superfície, para o Alto e para a Luz, para fora da Escuridão em que se encontra aquele que depois viremos a saber que era Persiles encerrado numa Masmorra no subsolo. Mas no início, só o que sabemos é que é uma Voz e, depois, ficamos sabendo que é Voz Humana. Lembremos Heidegger dizendo que os outros seres tem voz, o homem, além da voz, tem linguagem. A Literatura é essa Voz que se lança do Escuro. Essa Voz que busca ascender da Escuridão é a Literatura buscando ascender no claro-escuro da Escritura. É a Voz da Escritura querendo ascender para o Além do claro-escuro da Escritura. É também a vozinha débil dos livros visíveis de Escritura de Andara já querendo é o AlémAquém da Escritura, no Livro Invisível de Andara. Essa Voz é a Voz Não-Voz do Livro Invisível de Andara. Essa não-Voz, ela é que é a Voz não-voz essencial de Andara. E parece que a única que lhe interessa. Trans-silêncio. As páginas antes cobertas pelos Signos da Palavra buscando o em-branco da Ausência de Palavras.

14 de setembro de 2009

Asa no Ar

Vicente Franz Cecim





















Exalado pelo Alento: por que veio o Homem de Vento
Inalado pelo Alento, para Onde voltará?


E a O Que Quem pergunta
aqui
na Breve Residência

onde é
Asa de Sombra



dO sido
e
dO não será


1000 Castelos




Jesus Sombra


Por que certas coisas querem existir insistentemente, se manifestando sob várias formas, variantes? Castelo: há os de areia, o de Kafka, o de Kubla Khan primeiro como construção de pedra inacabada e depois como poema inacabado do Coleridge. Por aí haja alguém indício da Causa oculta de nós que faz haver o castelo de cartas, faz haver os castelos medievais com seus fossos e crocodilos e ponte levadiça ao redor, e os castelos dos contos de fadas. Então, é uma Forma que não se basta em si – nUma só – e se metamorfoseia constantemente para se afirmar mais abrangentemente, constante, persistente. Ela também gosta de brincar de trocar de identidade aparente, preservando sua Identidade de Castelo, porém. E assim vai nos cercando por todos os lados, os lados internos e os lados externos do homem. Seria porque a Idéia de Castelo - Platão – é migratória, e migra da pedra para a palavra - e o castelo que Kubla Khan começa a construir e deixa inacabado prossegue sua Outra realidade em outra substância, mantendo semelhança na sua, digamos, Natureza, um pouco do seu aspecto, mas não no seu material, e surge da pedra nas palavras no poema de Coleridge. Borges comenta essa migração em 7 Noites, se lembro. Porque o Castelo de Kubla Khan inacabado continuou inacabado no poema inacabado de Coleridge. Então, Borges diz que é Algo – oh, não se sabe O que? - que está, ainda, tentando vir a ser. Sob a forma de um Castelo. Mas o que será? Borges esqueceu que talvez Isso já tenha conseguido se tornar, ser, na forma do Castelo de Kafka. Nem mencionou. Mas se entende Borges, quando se considerada que Kafka não quis refazer, completar, o Castelo de Kubla Khan, quem quis foi Coleridge, que sonhou o Poema do Castelo, o castelo em forma de poema, ou Poema Castelo. Uma história cheia de Veredas que se bifurcam, do jeito que o Borges gostava de brincar. Borges não tem nada a ver com Kafka - K é existencial e mental - B é mental todo tempo - mas Borges não seria possível se não tivesse sabido da existência de alguém, antes, que foi Kafka. Eu acho. K diz que deve bastante a Dickens, que quis escrever O Desaparecido meio do jeito de David Coperfield. Bem, Dickens antecipa Kafka, bastante, no seu romance mais abrangente: Break House/Casa Quebrada, chamado aqui A Casa Sorturna - onde aparecem fundidos O Processo e o Castelo. É muito = a narração de um processo infinito numa imensa construção, esmagadora, centralizadora da Lei - o Tribunal de Londres. E na Casa Soturna, como em Kafka, a Lei é também uma Farsa. Só que em Dickens é a vida dos personagens que se torna absurda, pela corrupção e ineficácia da Lei, e em Kafka todo o Universo é destituído de um sentido reconhecível prosaicamente, e submersa todos – a Lei, K, a Vida – num Delírio sem tréguas. Melville também antecipa Kafka, mas enquanto Dickens antecipa em fabulação, Melville antecipa em personagem - Bartleby foi K antes de K - e continua sendo após K - de certa maneira Bartleby é mais que K porque é uma mistura de K com Odradeck.

Eu já brinquei de escrever um falso Kafka – só porque estava com saudade dele, e nunca conversei com ele, nunca passamos um segundo juntos andando nas ruas de Praga. Então, eu escrevi uma história como se fosse Kafka – apenas para ter ele por perto de mim.

Um dia, quem sabe, farei ela aparecer aqui. JS

Se o Adormecido leva um Gesto aos lábios


Vicente Franz Cecim




não Falar

para não nascer do Seu Ouvido
em Rumor O


não dito, lentamente não



Ouvir

para não nascer no meu ouvido
em Ramagens A


não dita, lentamente não



para não assustar as Ramagens do Rumor

indo e vindo


entre Nós




13 de setembro de 2009

KinemAndara


É assim que Cecim passa do romance ao filme

Pedro Veriano





Vicente Franz Cecim voltou a filmar. Seus dvds “Fonte dos que Dormem” e “A Lua é o Sol” trazem peculiaridades não encontradas em nenhum exemplo de cinema. Não vejo nada semelhante nem mesmo nos clássicos surrealistas. Citando que são “Kinemandara”, ou seja, Cinema de Andara, a terra do intimo do autor, mais do que uma Shangri-ka ou Passárgada, ele tenta se expor da forma que lhe chegam as idéias. O máximo que se pode concluir de uma temática é a frase que pesca de Franz Kafka: “Por impaciência perdemos o paraíso”, e, a seguir, “por impaciência não voltamos ao paraíso”. Escrevendo as frases, “A Lua é o Sol” pontua com uma visão panorâmica da cidade atrás de grades. Em seguida, em stopmotion, pessoas andando para uma parada de ônibus em uma praça. Não se queira identificar coisa alguma, embora se possa. As “silhuetas na paisagem” evocam o que disse Joseph Losey. E os filmes divagam por imagens paradas que devem dizer a Cecim muito de sua sensibilidade exuberante.
O cinema introspectivo é aquilo que Jean Cocteau falou: aquele em que a câmera faz a vez de uma caneta. Na época de Cocteau isso era um recurso poético. Hoje é real, com as minúsculas gravadoras digitais cumprindo roteiros imaginados diretamente para elas, sem passar pelo papel.
Em “Fonte dos que Dormem” há longos travellings pela mata, tomados de um automóvel em movimento. É crepúsculo (ou aurora). O papel do sol pequeno (poente ou nascente) persegue o autor. A lua parece um sol ou ele a ela nas primeiras cenas de “A Lua é o Sol”. Até que a luz difusa ilumine toda a tela e nada mais deixe que se veja.
Também há signos, como uma bola azul, correntes, gravuras que sugerem o paraíso perdido ou um inferno alcançado. Mas ninguém deva discernir o que há de material na obra de Cecim. Ele precisava do cinema para prosseguir a sua experiência literária. E adentra na poesia das imagens com intercessões de palavras. A força dessas palavras não precisa ser ilustrada sob ou sobre. Tudo é a casa do ego, ou a fonte do id, ou a alma de um poeta que tenta emergir do corpo. Se a gente se impacienta com o que vê, nada mais natural. Perdemos o paraíso e não temos força para voltar.A impaciência embota a percepção do outro e as pessoas, que não são iguais, não tentam se comunicar inteiramente. É assim que Cecim passa do romance ao filme/disco. Um criador que se completa.


Mostra KinemAndara
A Lua é o Sol & Fonte dos que dormem
Vicente Franz Cecim

Cine Líbero Luxardo
11/12/13 de setembro de 2009, 17horas.

Par ler ampliando II Terra da sombra e do não





























Para ler ampliando I A asa e a serpente































11 de setembro de 2009

Te-shan








- Como a forma e a imagem se encaram em um espelho brilhante, tu não és o refleto, mas o reflexo és tu

Quando descerem em Ti escuro e sol






Vicente Franz Cecim




















A última

gota de água acaba de subir aos Céus e a Terra

não é mais


a Esfera de Miragens




Agora,


esses seres de Lágrimas banidos dos Teus Olhos


buscam Refúgio



na Tua Mão de Pó




E não és o Lago



O Uivo em tua Memória não é a Padra que lançaste voltando à tona




Um homem é Sua Curva só por ter nascido




Estás

entre a Aurora e o Crepúsculo

como uma Dádiva


que se oculta antes do Gesto




Deita no Centro do leito da Serpente




Se

confundires os perdões escuros com a Lentidão

da Tua Estrela,



estás perdido




Tudo é Caverna e ecoa

Consulta os Clamores da Vida





* vFc/Foto Bruno Cecim

6 de setembro de 2009

Asa dos olhos



Vicente Franz Cecim



















Max Ernst






Quando um Lago
for lançado num Círculo

fora do tempo

por mãos vazias antes do gesto



Quem



estará na Margem
para receber, sem mãos,

as Doações do Centro adormecido



que Se amplia

despertado



em gratidões gratidões gratidões

em Cinzas Cinzas Cinzas



5 de setembro de 2009

Para alegrar uma esquina deserta

Vicente Franz Cecim



e é Assim que tu habitas uma
Meditação

de Estrelas e Peixes e Árvores se apagando ao teu redor

no teu Rosto de Terra


Onde


não choram todos juntos não
riem todos juntos, e Não se sabe

até Saber:
que a Lágrima é Meditação de Tudo
e o Riso: Meditação de Tudo


e Esses
são os Dons da Semente Una Oca


Escuta: O Eco,
aqui


O sermos
as Aves de Dois Cantos

enquanto, Lá,


O sorrindo chora O chorando ri



Enquanto passa a Nau de Silêncio


















Edward Hopper