14 de setembro de 2009

1000 Castelos




Jesus Sombra


Por que certas coisas querem existir insistentemente, se manifestando sob várias formas, variantes? Castelo: há os de areia, o de Kafka, o de Kubla Khan primeiro como construção de pedra inacabada e depois como poema inacabado do Coleridge. Por aí haja alguém indício da Causa oculta de nós que faz haver o castelo de cartas, faz haver os castelos medievais com seus fossos e crocodilos e ponte levadiça ao redor, e os castelos dos contos de fadas. Então, é uma Forma que não se basta em si – nUma só – e se metamorfoseia constantemente para se afirmar mais abrangentemente, constante, persistente. Ela também gosta de brincar de trocar de identidade aparente, preservando sua Identidade de Castelo, porém. E assim vai nos cercando por todos os lados, os lados internos e os lados externos do homem. Seria porque a Idéia de Castelo - Platão – é migratória, e migra da pedra para a palavra - e o castelo que Kubla Khan começa a construir e deixa inacabado prossegue sua Outra realidade em outra substância, mantendo semelhança na sua, digamos, Natureza, um pouco do seu aspecto, mas não no seu material, e surge da pedra nas palavras no poema de Coleridge. Borges comenta essa migração em 7 Noites, se lembro. Porque o Castelo de Kubla Khan inacabado continuou inacabado no poema inacabado de Coleridge. Então, Borges diz que é Algo – oh, não se sabe O que? - que está, ainda, tentando vir a ser. Sob a forma de um Castelo. Mas o que será? Borges esqueceu que talvez Isso já tenha conseguido se tornar, ser, na forma do Castelo de Kafka. Nem mencionou. Mas se entende Borges, quando se considerada que Kafka não quis refazer, completar, o Castelo de Kubla Khan, quem quis foi Coleridge, que sonhou o Poema do Castelo, o castelo em forma de poema, ou Poema Castelo. Uma história cheia de Veredas que se bifurcam, do jeito que o Borges gostava de brincar. Borges não tem nada a ver com Kafka - K é existencial e mental - B é mental todo tempo - mas Borges não seria possível se não tivesse sabido da existência de alguém, antes, que foi Kafka. Eu acho. K diz que deve bastante a Dickens, que quis escrever O Desaparecido meio do jeito de David Coperfield. Bem, Dickens antecipa Kafka, bastante, no seu romance mais abrangente: Break House/Casa Quebrada, chamado aqui A Casa Sorturna - onde aparecem fundidos O Processo e o Castelo. É muito = a narração de um processo infinito numa imensa construção, esmagadora, centralizadora da Lei - o Tribunal de Londres. E na Casa Soturna, como em Kafka, a Lei é também uma Farsa. Só que em Dickens é a vida dos personagens que se torna absurda, pela corrupção e ineficácia da Lei, e em Kafka todo o Universo é destituído de um sentido reconhecível prosaicamente, e submersa todos – a Lei, K, a Vida – num Delírio sem tréguas. Melville também antecipa Kafka, mas enquanto Dickens antecipa em fabulação, Melville antecipa em personagem - Bartleby foi K antes de K - e continua sendo após K - de certa maneira Bartleby é mais que K porque é uma mistura de K com Odradeck.

Eu já brinquei de escrever um falso Kafka – só porque estava com saudade dele, e nunca conversei com ele, nunca passamos um segundo juntos andando nas ruas de Praga. Então, eu escrevi uma história como se fosse Kafka – apenas para ter ele por perto de mim.

Um dia, quem sabe, farei ela aparecer aqui. JS