18 de maio de 2011

Andara quer a Origem, o Antes



ENTREVISTA

























A viagem a Andara, onde inexiste a oposição entre o natural e o sobrenatural, não tem fim e pode ser iniciada em qualquer de seus momentos, por onde quer que se penetre nela através de um dos livros visíveis de Viagem a Andara oO livro invisível. Mas o que é Andara? É uma transfiguração, em região-metáfora da vida, da Amazônia, onde o autor nasceu e vive até hoje, e é, também, o próprio autor, o leitor, o universo. E não se esgota nisso: dentro da viagem, há ainda outra viagem, que tudo quer inverter. Diz o autor em entrevista à revista Azougue: "Andara é Coisa que viaja por dentro e no sentido inverso: quer retornar dos dedos dos pés ao calcanhar de Aquiles do homem, ali onde ele é mais sensível à Hipótese Onírica e Lúdica e Naturalmente Sagrada da vida. Andara quer a Origem, o Antes do ponto em que tudo começou a se perder do Todo, o ponto oculto de nós, homens, que só se consente a nós em Relances, Vislumbres."






14 de maio de 2011

ENTREVISTA Habeas Asas, Sertão do Céu: a fábula aérea de Arthur Cecim



O escritor paraense recebe
o Prêmio Sesc Nacional de Literatura 2010

A edição de 2010 do Prêmio Nacional Sesc de Literatura recebeu 1.142 obras provenientes de todos os estados e 76 foram selecionadas para a etapa final, sendo 37 romances e 39 coletâneas de contos. Na categoria Romance, a obra Habeas asas, Sertão do céu, de Arthur Cecim, foi apontada como a vencedora pela comissão de jurados de sua categoria, composta pela escritora Alice Ruiz e pelo professor e pesquisador Antonio Vicente Pietroforte. O romance tem pássaros como personagens, mas durante a narrativa o leitor os sente como seres humanos. A história é apresentada do ponto de vista do céu, habitat dos personagens, e Arthur Cecim inova na linguagem que, segundo Alice Ruiz, "se alimentou das dicções mais inovadoras, como a de Guimarães Rosa, Haroldo de Campos, Paulo Leminski, Mia Couto e da poesia de Manoel de Barros".O livro será publicado e distribuído pela Editora Record, parceira do SESC no concurso literário desde 2003.A cerimônia de lançamento das obras será em 4 de julho, na Academia Brasileira de Letras, no Rio de Janeiro.

Na entrevista a seguir Arthur Cecim fala de sua vida e obra.


ENTREVISTA

Você vem de uma família de escritores. O que tem a di

zer sobre isso?


- Venho do vínculo sagrado com a minha Vó, Yara Cecim e com meu pai, Vicente Franz Cecim. Desde criança, já existiam imagens em mim que hoje eu transformo em literatura, em livro. E foi minha vó Yara quem me ensinou o sagrado das coisas naturais, contava estórias, eu aprendi a narrar através dela, ela me contava estórias daqui como se fossem estórias épicas, lendas que eram teogonias. Minha vó vem de uma região, o Caxambu, onde homem e natureza são um só. Meu pai Vicente me ensinou as imagens oníricas, que me tornaram mais clara a indiferença entre céu e terra, sonho e realidade. Sigo o caminho de uma não-literatura, algo que está na terra, antes de chegar aos livros: os livros que escrevo são símbolos da indiferença entre natural e sobrenatural, coisa que meu pai me ensinou desde sempre, nos tempos mais arcaicos de minha infância.

Tem alguém a mais que lembrar: minha bisavó, Honorina Bastos, mãe de minha avó Yara, era uma poetisa transcendente. Foi ela quem me abriu um clarão, uma imagem eterna em minha mente, seus poemas são divinas implorações: ela tem um poema do qual me alimento eternamente.

Você é um dos poucos escritores paraenses que já lançam seu primeiro livro por uma grande editora nacional e que poderá ser lido por leitores de todo o Brasil. Qual o significado disso?

- É preciso que façamos uma literatura mais avançada, a literatura regional está esgotada, ressequida, sua fórmula, que é uma fórmula, não é uma forma de literatura autêntica. Os escritores de nossa região devem tentar outras formas de expressão, temos em nossa região todos os elementos para fazer uma literatura mais avançada: devemos tratar e fazer literatura como “transregião”, indo além do visível, literatura de forte imaginação, criadora de novos mundos. A literatura regionalista resseca as possibilidades porque estanca no particular, toma o particular como particular. Devemos dar asas universais ao particular, transregionalizá-lo. Fazer uma migração invisível dentro do próprio visível. Meu recado aos outros escritores é: sonhem, pois a região em si já é onírica.

Do que trata o seu livro?

- É uma estória baseada numa fábula, é uma parábola, na qual elementos sagrados e profanos, mundanos e supramundanos co-existem como um só, vistos no mesmo espelho da alma, o livro é uma busca pela bem-aventurança na terra. Ele fala de um sertão da alma, que habita em todos nós, todos os seres do universo. Somos filhos do universo, não é? Então temos esta nostalgia eterna. No livro não há diferença entre o natural e o sobrenatural, o sobrenatural é somente um sobre o natural.

Como você abordou esse tema?

- No livro é mantido o substrato regional, o elemento natural, mas a linguagem estética é universal. Por isso o livro vai além da literatura regional: ele mergulha naquilo que a realidade não diz comumente, mas diz pra si mesma, encoberta pelo cotidiano dos homens. Como se fosse uma transvisão: ele aborda o visível como se o visível tivesse uma alma, um segredo a nos contar, a nos confessar. Eu via as “visões” do mundo natural e as conjuguei com minhas visões e imagens internas: o livro é um enamoramento das duas visões. Eu sempre soube que o sobrenatural está onde menos o procuramos: na visão do mundo natural e quanto mais humilde e sub-natural, mais ali está o sobrenatural. As coisas se entregam mais a elas mesmas, é Ali que a realidade está dizendo mais sinceramente, devemos olhar para ali. Mas esta visão é uma “visão”, figuração do universal, imagem do universo vivo e não mera ótica de nossos olhos físicos. A semiótica daquela imagem é um interlúdio entre natural e sobrenatural, uma passagem secreta e onírica entre os dois. Um sonho real ou uma realidade onírica. Não é só surreal, porque não é uma distorção dos elementos do real, é também supra-surreal, porque distorce os próprios elementos que distorcem o real. O livro é uma migração eterna das palavras. Cada palavra é um sertão vivo.

Quais são seus escritores preferidos?

- Na leitura de ficção, tenho paixão fervilhante por Jean Giono, um escritor francês admirador do interior da França, adorava a vida camponesa dos vilarejos e a solitude da natureza, e a preferia ao invés de andar nos círculos parisienses. Ele tem um realismo onírico, um realismo surrealista que me encanta. Seu livro mestre, obra prima: O cavalheiro do telhado e a dama da sombra. Lendo os livros de Jean Giono me lembro da linguagem viva e cantante dos sertões de Guimarães Rosa, o qual aliás apreciava Giono. Também admiro profundamente o mexicano Juan Rulfo e sua obra brilhante Pedro Páramo, que é uma verdadeira divagação entre as pessoas e o silêncio, há uma voz no livro. Também é de minha admiração Witold Gombrowicz, e aquela coisa do universo vivo por debaixo de nossos olhos físicos. Como tradutor e professor de língua inglesa, não poderia deixar de mencionar Charles Dickens, que tem uma literatura muito viva e faz na língua inglesa o que a meu ver o Guimarães Rosa faz na língua portuguesa: existe em Dickens um sabor verdadeiro pela linguagem como em Guimarães Rosa. Na poesia, gosto do lirismo e da sinceridade fraternal dos versos livres de Walt Whitman.

Entre os escritores nacionais, o maior de todos é para mim Guimarães Rosa: todo o universo conversa consigo em Grandes Sertões: Veredas. Em Guimarães vemos o universo vivo no diálogo migratório, no diálogo vivo das sagas da vida. Guimarães Rosa tem uma ternura pelo empírico, tem uma visão ampliada do universal no particular, um conhecimento anímico do empírico, as coisas estão todas vivas e presentes na linguagem, a linguagem é o que universaliza as coisas. Ele fala com amor do empírico, descreve com sabor as realidades que falam por si só, sua ternura é um amor do universal nas coisas particulares. Os gerais são um sertão do mundo. Entre outros, admiro também Machado de Assis e Mário Peixoto. Na poesia, Augusto dos Anjos.

Estudo filosofia na Universidade Federal do Pará e tenho também na filosofia um caminho através da estética. Schelling, pensador alemão do idealismo, fala da possibilidade de uma filosofia da arte como retorno à unidade e origem dos tempos arcaicos: nele não há diferença entre natureza e homem, entre o poético e o físico, mýthos e logos. Schelling pensa uma poética orgânica, nele a natureza é dotada de alma, nele a natureza é arquétipa: para mim, isto é pura mitologia da natureza. Me identifico com este modo de pensar porque devemos resgatar o encantado que a mitologia um dia nos proporcionou. Houve um tempo, na antiguidade, onde a mitologia era pensamento e poesia, reflexão e narração, onde a natureza era antropomorfa e o homem era natureza. Este elo se partiu: devemos resgatá-lo.

Qual a relação entre a filosofia e sua literatura?

- A filosofia expõe o universo assim como minha literatura, nela não há diferença entre homem e natureza, o mitológico e o físico, o mythos e a phýsis, e isto está no próprio título: Habeas Asas, Sertão de Céu!

No meu céu, sobrenatural, há sertão. No sertão, igualmente sobrenatural, há céu. É como eu disse: o sobrenatural não é repartido do natural, ele é somente um sobre o natural, ele paira. A filosofia, seguindo a fusão pensada por Schelling, filósofo da natureza-alma, deve resgatar seu vínculo com o poético. A natureza, como física, deve resgatar seu valor poético. Mera ciência de um lado e sobrenatural desacreditado são uma desagregação que deve ser desfeita. Filosofia e poesia devem retornar ao ponto de onde partiram, como quando eram uma vertente só. Filosofia e poesia devem retornar ao ponto de encantamento.

Como eu vinculo a filosofia com a minha literatura? Por meio da poesia.

Eu acredito que a natureza seja uma poética orgânica. É a poesia que possui o substrato tanto da filosofia quanto da literatura de ficção: a literatura não deve ser somente descrição, deve ser sim descrição poética, e a filosofia não pode ser apenas reflexão, deve ser sim reflexão poética. Heidegger, talvez seguindo os caminhos de Schelling, já falava do vínculo esquecido entre filosofia e poesia, quando ambas perguntavam pelo Ser de um modo originário, que a techné instrumentalizada das ciências e do cotidiano ajudaram a encobrir. Heidegger já falava deste esquecimento do ser pelo ente. Benedito Nunes bem atentou para a necessidade do sentido como aquilo que humaniza a filosofia: este sentido só pode ser buscado na pergunta pelo ser, e esta busca autêntica só se acha no seio do poético, onde o ser se revela, livre e espontaneamente sem as amarras da instrumentalização cotidiana do saber. Todo o sentido do ser está numa correlação entre hermenêutica e poesia, a hermenêutica é o ponto de encontro entre a filosofia e a poesia, já nos dizia Benedito Nunes.

Você já tinha publicado outras coisas?

- Sim, já havia publicado poemas em sites de literatura da internet.

Você pretende continuar escrevendo?

- Sim. Já tenho outros livros escritos ainda inéditos e prontos para publicação. E continuo escrevendo novas ficções. Também escrevo poesia. Espero poder lançar meus poemas em breve. Vou seguindo a vereda.


ARTHUR CECIM é romancista, poeta, filósofo e tradutor de inglês. Nasceu e vive na Amazônia, em Belém do Pará, Brasil. E-mail arthurcnewcastle@yahoo.com.br



12 de maio de 2011

Caminho dos corpos lentos

Viccnte Franz Cecim



E o Céu? Se

pergunta a Terra,


enquanto desces ao encontro do Teu Centro



eis: a espreita do Suspeito de Si Mesmo


Eis a Penumbra da Água em silêncio

Na Fonte,

não são Longos os peixes que te incineram


Ainda uma vez um Sim de pedra

se ocultou


na Noite,



e enquanto tombas vais lembrando que Não És


























11 de maio de 2011

Acesso a Andara em Cultura Pará





Vicente Franz Cecim nasceu e vive em Belém do Pará, na Amazônia, Brasil. Desde que iniciou em 1979 a invenção de Viagem a Andara oO livro invisível, se devota unicamente a essa obra imaginária, que chama de literatura fantasma e diz escrever com tinta invisível. Os livros visíveis que escreve emergem dessa Viagem, ou, segundo o autor, não-livro, ambientados no território metaf

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